terça-feira, 31 de agosto de 2010

O que é e como surgiu o Bloco da Canalha.

Em 2008 o "Bloco da Canalha: a vil ralé que cospe no chão!" foi pra rua pela primeira vez durante o carnaval. Na época fiz um pequeno texto que iria sair em jornalzinho de Ananindeua (Região metropolitana de Belém), nem lembro se foi publicado ou não.
Seja como for nosso bloco de carnaval de rua já vai para o 4º ano de atividade, e já pegamos um pouco de experiência neste tempo. Agora já existe concurso interno pra escolha de marchinhas, temos a presença de artistas de outros grupos como o Boi da Terra, o Movimento Literário Extremo Norte (MLEN), o Grupo de samba À corda Bamba, que nos dão apoio, etc. Mas mantemos a sátira e a crítica social como principal característica.
Sexta, dia 03 de setembro, às 19:30, estaremos no programa da TV Cultura, "Cultura Pai D'égua", no lançamento de um clip do Grupo Senta a Peia, junto também com o MLEN. Quem puder assista o programa.
Deixo abaixo o texto que fiz para o primeiro ano do Bloco, que conta um pouquinho de com ele surgiu.


A fantasia campeã de 2010: Cris com "Eu sou neguinha"


"Lançamento do Bloco da Canalha em 2008.

Numa mistura de bom humor e um dose de sátira o “Bloco da Canalha: a vil ralé que cospe no cão” saiu no seu primeiro ano de carnaval pelas ruas do bairro da Cidade Velha em Belém. O cortejo ocorreu no dia 27 de janeiro e levou pra rua um grupo pequeno mais muito alegre de brincantes que caminharam dançando e cantando antigas marchinhas carnavalescas e a marcha oficial do Bloco, que tinha como tema este ano o PAC. O bloco saiu do bar Le Chat Noir, na Avenida 16 de Novembro com Triunvirato por volta das 18 h e se dirigiu para a Praça do Carmo onde ao encontrar outros blocos carnavalescos encerrou seu cortejo. Tudo começou como a maioria dos blocos de carnaval, como uma grande brincadeira. Um grupo de amigos, quase todos ex-estudantes do curso de história da UFPa, resolveu aproveitar os seus constantes encontros boêmios para fundar um bloco carnavalesco. Com um mínimo de organização contrataram uma bandinha, um carro-som, conseguiram apoio para cartazes e panfletos e colocaram o bloco na rua, literalmente.


Bar Velhharia


O nome do bloco decorre ainda dos tempos de universidade. Após as aulas o mesmo grupo de amigos costumavam se encontrar nos botecos das proximidades da UFPa, no Guamá. Influenciados pelas aulas de história e discutindo sobre a história do Brasil costumavam brindar “à canalha: a vil ralé que cospe no chão”, uma das denominações que a elite do século XIX usava para se referir preconceituosamente ao povo, assim como outros termos como: “as classes perigosas”, “o populacho”, “a turba”, “o povinho”, etc. De tanto brindarem à ralé, ao povinho, às classes perigosas e principalmente à canalha o grupo acabou ficando conhecido como A Canalha. Daí que, anos mais tarde, o bloco carnavalesco recebeu o nome de "Bloco da Canalha: a vil ralé que cospe no chão". A ironia, a sátira e o bom humor ficaram por conta da marchinha carnavalesca, de autoria de Osvaldo Santos e Tony Leão, que tinha como tema o PAC. Mas não era o mesmo PAC que estamos acostumados a ouvir falar pelos jornais, o Plano de Aceleração do Crescimento do governo federal. O PAC do Bloco da Canalha é, na verdade, o Plano de Aceleração da Canalha, que poderia muito bem ser traduzido como Plano de Aceleração da Ralé, ou do Povinho, ou das Classes Perigosas, ou do Populacho, etc. Neste plano o carnaval, como momento de subversão da ordem se torna a ocasião para a canalha “acelerar o seu crescimento” já que, como diz a letra da marchinha, todos os impostos serão gastos no carnaval: Plano de Aceleração Canalha/ Neste plano você não se vai se dar mal/ Já que todos os recursos/ Serão gastos no carnaval/ Plano de Aceleração Canalha/ Nosso PAC não é nada mal/ Pois no PAC da canalha/ CPMF vai toda pro carnaval/ PAC, PAC, PAC, PAC!/ Plano de Aceleração Canalha/ PAC, PAC, PAC, PAC/ E o carnaval de nossa gentalha...


Poeta Eliana Barriga, uma das candidatas no concurso de fantasia

Ano que vem, informam os organizadores, o “Bloco da Canalha: a vil ralé que cospe no chão” sairá novamente no carnaval, com uma bandinha tocando marchinhas antigas e uma nova marchinha oficial, com novo tema a ser ainda escolhida pelos integrantes. E desde já convidam a todos: já que o carnaval é hora de subverter a ordem, hora da farra, hora da turba ir à rua, da balburdia organizada - já que “me organizando posso desorganizar e desorganizando posso me organizar”, como diria Chico Science - momento no qual bulhas, vozerias, batuques, carimbós e sambas são permitidos. É também a hora que a canalha, a vil ralé que cospe no chão, que fica calada o ano todo, dá passagem pra ironia e pro carnaval."

sábado, 28 de agosto de 2010

Bloco da Canalha no "Cultura Pai D'égua".

Ontem foi a gravação do programa “Cultura Pai d’égua” no quintal do poeta Ruy do Carmo. Estivemos presente, junto com vários amigos, representando o “Bloco da Canalha: a vil ralé que cospe no chão”. Programa, que é apresentado por Roger Paes, será exibido na TV Cultura regional (Pará) na próxima sexta-feira (03/09/10) às 19:30 hs, com reapresentação no domingo (05/09/10) as 21 hs.
O programa trata de temas culturais da região e do Brasil. A temática deste dia foi o lançamento do clip do grupo “Senta a peia”, que estava presente fazendo um som de primeira qualidade. Além deste esteve presente o MLEN (Movimento Literário Extremo Norte) fazendo um sarau literário e o “Bloco da Canalha”. Conosco estava também o grupo de samba e chorinho “A Corda Bamba”.
Fica a dica pra quem quiser ver este encontro cultural!
Logo postarei algo falando um pouco da história de nosso bloco de carnaval.

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Twitter e a política.

Não tenho muito a dizer hoje. Só quero reafirmar o poder dos meios de comunicação de massa via internet. Ontem o twitter bombou com o primeiro debate na TV RBA (Belém-PA) para governador do Estado. O candidato do PSOL, Fernando Carneiro, que até então era um dos candidatos menos conhecidos, tornou-se rapidamente no twitter um dos mais citados no Brasil.
Fenômeno parecido ocorreu no primeiro debate para presidente na TV Band. Lá o grande citado foi Plínio de Arruda Sampaio, do PSOL também, que até então era quase desconhecido para a maioria dos brasileiros.
Lembro que até antes da proibição efetiva da “boca de urna” a eleição se dava na rua. Muitos indecisos decidiam seu voto pela conversa com amigos na frente da zona eleitoral ou pelo “santinho” com o número do candidato, dado em cima da hora. Pelo que vi ontem o twitter tomou entre os internautas esse lugar! Mas a questão é saber até que ponto o veículo novo pode mudar algo, já que as pessoas são as mesmas, a hegemonia do pensamento conservador continua a mesma?!
Independente disso parece-me que estes meios têm um grande potencial principalmente para partidos que não têm espaço ou têm pouco espaço na mídia tradicional (TV e Rádio) e para movimentos sociais totalmente excluídos nos meios hegemônicos de comunicação. As eleições têm mostrado isso até agora. Mas ainda não sabemos até onde vai este potencial.
Não sabemos se no campo da política institucional isso vai se transformar em votos para os partidos de esquerda. Para os movimentos sociais como o MST, Mov. de atingidos por Barragens, etc. o twitter tem se mostrado uma importante ferramenta, aparentemente.
Até aqui parece ser um instrumento independente, livre dos oligopólios midiáticos. Será?
Deixemos pra concluir isso no fim das eleições!

sábado, 21 de agosto de 2010

Um poema de Augusto dos Anjos.

Augusto dos Anjos é um dos meus 5 poetas preferidos, na verdade está entre os 3, eu acho. Gosto dele, sobretudo em meus momentos de crises existenciais. Pra quem não sabe, as crises existenciais são comuns entre os intelectuais e pequeno-burgueses. São momentos em que o indivíduo revê seus valores, seus princípios e conceitos. Como disse, coisa de pequeno-burguês, porque pobre, infelizmente ou felizmente, não tem tempo pra esse tipo de coisas...
Bom mas voltando ao Augusto dos Anjos, tenho uma relação muito boa com este poeta. Passo tempos sem lê-lo, mas sempre o releio e sempre o redescubro e o admiro.
Neste sábado sonolento, pra mim que estou me recuperando de uma poderosa ressaca, lembrei de um dos seus poemas que mais gosto e gostaria de dividi-lo com todos aqueles que me visitam.
Sendo assim, bom sábado a todos!


Psicologia de um vencido

Eu, filho do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênesis da infância,
A influencia má dos signos do zodíaco.

Profundíssimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância...
Sobe-me à boca uma ânsia, análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.

Já o verme – este operário das ruínas –
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,

Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!

(Augusto dos Anjos)

Tenho medo!

Como todo mundo, tenho medo. Ora todo mundo tem medo de algo.
Como este blog é meu mesmo e posso colocar tudo que me passa na cabeça vou elencar os meus medos principais:
1. Tenho medo de ir em lugares com muita gente branca e moderna reunida, penso que eles podem tentar me catequizar ou me civilizar;
2. Tenho medo de pegar em lesma – já viram como são nojentas?!
3. Tenho medo de alguns políticos, por exemplo, Maluf, Collor, FHC, Serra, Barbalho, a grande maioria dos pertencentes aos PSDB, DEM, etc., etc. Tem tantos outros, mas não dá pra colocar todos aqui – não é que eu tenho medo real de encontrá-los, mas sei lá é bom não arriscar!
4. Tenho medo de andar sozinho nas ruas de São Paulo. Medo de levar porrada ou alguém me incendiar, coisas do tipo. Claro que isso não vale pra todos de São Paulo, obviamente, mas é bom não arriscar;
5. Tenho um medo particular do Papa e do Edir Macedo;
6. Tenho medo de policiais – da maioria, não de todos;
7. Tenho medo de juízes;
8. Tenho medo de atrizes globais que vão à TV dizer: “eu tenho medo!”;
9. Tenho medo de pessoas que não fumam, não bebem, não comem gordura, são saradas, são contra a legalização do aborto e da maconha, etc.;
10. Tenho medo de secretários e assessores de pessoas “importantes”;
11. Tenho medo de apresentadores de jornais como os da Globo. Neste quesito tenho medo particular do Datena;
12. Tenho medo dos “falcões” norte americanos assumirem o poder;
13. Medo de Matinta-Pereira – sei que não existe, mas sabe como é que é, né! Melhor não provocar!
14. Medo de jovens conservadores. Prefiro mil vezes os velhos radicais e comunistas;
15. Tenho muito medo de me tornar um velho conservador;
16. Por fim quero dizer que eu acredito na teoria da conspiração: eu acho de verdade que a direita existe; que existe racismo no Brasil; que existe pobreza e ela não é uma questão simbólica; que existem grupos extremamente conservadores na igreja e que eles tem um projeto de mundo racista, machista e em alguns casos quase ou totalmente fascistas; que existe o imperialismo; que...
Eu tenho medo!
Mas como já disse uma vez Belquior: “eu tenho medo e o medo está por fora, o medo está por dentro do meu coração...”


Quais seriam os medos de vocês, meus poucos mas valentes seguidores?

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Padrão nacional de jornalismo tosco.

Há algum tempo atrás eu assistia os telejornais paraenses, particularmente o “Balanço Geral”, e achava a coisa mais tosca do mundo. Depois que passei uma temporada em Porto Alegre e no Rio de Janeiro vi que era uma tendência da Record: um jornalismo popular e tosco (não só dela é claro, mas falarei apenas dela agora).
Bom, isso não é novidade pra ninguém. Acho que foi Ratinho & Cia. que inventaram isso, ou sei lá quem o fez antes dele. Mas, o que me assustou foi a similitude do modelo Brasil a fora.
Em Porto Alegre o apresentador é um dos mais toscos: ele pula, se joga no chão, gesticula, grita, berra, muge, grune, etc., etc. De praxe, fala mau dos políticos, xinga todo mundo, reclama da violência urbana, fala que a polícia tem que esculachar com todo mundo e reclama quando esta não o faz. Depois fala que a polícia agiu bem em alguma operação quando o “meliante” foi morto, etc.
No Rio de janeiro o apresentador é ninguém mais ninguém menos que o Wagner Montes, o ex-jurado do “Programa Silvio Santos” nos anos 80 (alguém ai lembra?). Segue mais ou menos o mesmo modelo do seu colega gaúcho. Perto destes até que o apresentador do programa paraense é polido – imaginem então!
Dentre as coisas que caracterizam este jornalismo esta uma espécie de “populismo midiático” (reclamar sobre coisas para o povo de forma paternalista e fanfarrona!) e um claro conservadorismo político (críticas aos “direitos humanos”; defesa da pena de morte “pra bandido”, defesa da redução da maioridade penal; visão policialesca da sociedade, etc.).
Deixo o vídeo de um dos momentos mais espetaculares do apresentador do Rio de Janeiro: quando este comenta a morte de três bandidos pela polícia.


Ninguém pode dizer que não é engraçado. O problema é que se trata de jornalismo e não de show de calouros do Silvio Santos!

Ai me fica a seguinte dúvida: o que é pior, o jornalismo polido, civilizado, branco e burguês (que nos aliena todos os dias na Rede Globo) ou o jornalismo tosco e populista de programas como os que citei (que também nos aliena todos os dias)?
Infelizmente em se tratando de jornalismo da TV aberta estamos entre a cruz e a espada!

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Seresta da Canalha.

Vasculhando meus arquivos poéticos achei um documento com vários poemas intitulados “Poemas para seresta”. Tratava-se da “Seresta da Canalha”, movimento que inventei há algum tempo atrás, acho que a uns 5 anos. Consistia em reunir umas pessoas amigas, do meu grupo de amigos, levar no bolso um punhado de poemas, comprar umas cervejas no supermercado – que eram mais baratas – e circular noite a fora pela cidade. Lembro que realizamos 3 serestas.
A primeira, contudo, foi a mais engraçada: Carlos, Willian e eu saímos perambulando por Belém, com nosso isopor cheio de cervejas. Eu, o suposto poeta do grupo, estava encarregado de recitar as poesias, coisa que fiz de fato em vários momentos.
Ocorre que a maioria de nossos amigos não foi e, curiosamente, não tínhamos nenhum amigo que tocasse violão. Daí que foi uma seresta sem violão. Mas fomos felizes: andamos de rua em rua bebendo, falando bobagens e recitando poemas. Lá pelas tantas da noite, Carlos, já um tanto quanto embriagado, resolveu urinar em uma praça, Da Trindade. Foi advertido pelo guarda da área, mas mesmo assim realizou sua tarefa e ainda ofereceu umas bebidas para o camarada. Tive que ir buscá-lo pra evitar algum problema.

Mais tarde, num misto de embriaguês e empolgação, Carlos começou a pirar no meio da praça, andava de um lado pro outro e se jogou no meio do jardim desaparecendo entra as plantes e algumas flores...
No fim da noite deu tudo certo. Depois de tanto perambularmos de lá pra cá, Carlos e eu adormecemos na calçada da Praça da República e Willian, o boêmio mais empedernido que já conheci, ficou bebendo as últimas cervejas enquanto nos vigiava. Entre mortos e feridos salvaram-se todos.
Lembro que acordei com o calor da cidade e Carlos ainda dormia bêbado. Tomei o último gole como café da manha e todos nós seguimos nosso caminho.
As duas outras serestas foram também interessantes: numa delas amanhecemos na Praça Batista Campos: Carlos dormindo sentado em uma calçada da praça, Willian, Piramutaba e eu acordados próximo a um laguinho.
A última seresta foi a que deu mais gente, a maioria dos nossos amigos apareceu, inclusive com a presença de nosso violeiro oficial (Osvaldo Santos), porém, como a maioria estava com medo de assaltos madrugada a fora, acabamos ficando no quintal da casa dos estudantes universitários, na 16 de novembro, o que acabou deixando o “evento” menos atraente.
As “serestas” acabaram ai, foi um projeto que não deu muito certo, uma coisa quase adolescente (não na idade obviamente!), mas foi muito bom enquanto durou. Guardo boas lembranças disso, do tempo que eu morava na cidade e a cidade morava também em mim.
Em homenagem a nossa adolescência e à finada “Seresta da Canalha” canto então um último poema, faço minha as palavras de Paulo Leminski:

quando eu tiver setenta anos
então vai acabar esta adolescência

vou largar da vida louca
e terminar minha livre-docência

vou fazer o que meu pai quer
começar a vida com passo perfeito

vou fazer o que minha mãe deseja
aproveitar as oportunidades
de virar um pilar da sociedade
e terminar meu curso de direito


então ver tudo em sã consciência
quando acabar esta adolescência

Paulo Leminski

Da insensibilidade dos historiadores com o presente.

Pesquiso duas vezes por semana na Academia Paraense de Letras. Confesso que não sou adepto de academias literárias, prefiro a poesia dita marginal, mesmo considerando que foi o grande Machado de Assim que criou a Academia brasileira no Rio.
Seja como for não da pra negar que as Academias de Letras Brasil a fora são espaços carregados de história, em todos os sentidos. São nestas instituições que muito da história intelectual e literária do Brasil mantêm grandes acervos. Livros que não encontramos mais em lugar nenhum, encontramos nelas.
Dou um exemplo: na APL encontram-se a coleção completa da revista Belém Nova, que no Pará foi o local de florescimento dos poetas modernistas liderados por Bruno de Menezes, na década de 1920. Este é apenas um exemplo.
Mas o que queria dizer era o seguinte:
Estava eu na APL, vasculhando papeis velhos, como sempre, e chegou uma historiadora na busca de uma revista específica. Não sei se encontrou, mas enquanto estava lá ela foi abordada por um velho acadêmico, “imortal” melhor dizendo, que se dirigindo a ela disse:
“O dia que você estiver com preguiça de ler um livro grande como este [apontando para um livro na mesa da sala], leia um destes!”.
E jogou um de seus pequenos livrinhos, algo parecido com um cordel, para que ela olhasse.
A pesquisadora pegou o livrinho de maneira desconfiada, olhou desatentamente, folheou com visível desinteresse e , sem dizer uma palavra, o devolveu para o autor, voltando a fazer o que estava fazendo: conversando com outra pesquisadora que estava na pequena sala de pesquisa.
Ora minhas caras e meus caros amigos, permitam-me ser chato – o que faço com primor neste blog, já o sabem meus singelos seguidores: o que poderíamos esperar de alguém que vai a uma Academia de Letras consultar o seus arquivos, é abordada por um de seus “imortais” que a oferece um livro para aferição? Acho que o mínimo a se esperar seria a educação de olhar com atenção (mesmo que por simples e pura etiqueta!) e um agradecimento. Afinal era isso que se esperaria para qualquer pessoal, independentemente de ser ou não um “imortal”.
Este caso banal que hora descrevo mostra uma coisa que observo muito na seara dos historiadores (e outros cientistas sociais no geral): um desapego pela história! Como assim, perguntariam meus valorosos 17 seguidores?
Desapego sim! Pois a maior parte dos historiadores especializa-se demasiadamente em seu tema de pesquisa, seja lá qual for, torna-se um grande conhecedor de uma década, uma metade de século, uma geração, um tema, uma pequena amostra da realidade, mas esquece ou não tem opinião, ou pior ainda, não expressa interesse em todo o resto da vida (passada ou presente).
Às vezes parece que o historiador que estuda, por exemplo, a religião popular no fim do século XIX não tem nenhuma opinião, desconhece, não percebe, prefere não comentar nada sobre a religião popular do presente. Conheço historiadores que ficariam falando horas sobre o seu tema de pesquisa, mas que não teriam o que dizer sobre uma matéria sobre questões presentes, por exemplo, a questão do MST, ou a arte pop, ou o governo Hugo Chaves, ou o funk carioca, ou seja o que for. Não que eu pense que temos que ter opinião sobre tudo, mas não somos débeis mentais, antes de sermos especialistas somos seres de pensamento e emoção... Se perdemos a capacidade de observar e sentir o nosso tempo, não podemos observar e sentir o passado.
Isto serve particularmente para os historiadores, mas não só pra eles: um médico, por exemplo, que não consegue ver antes de qualquer coisa uma vida plena em seus pacientes de consultório, e não só um conjunto de órgão, circulação e funções, não será um bom médico!
Entrar numa academia de letras é ter contato com a história em duas esferas: na história que os arquivos, os livros antigos, as revistas guardaram e na história viva dos próprios personagens que estão lá, ainda hoje, agora, fazendo a história literária de uma região. Acho que estas pessoas merecem pelo menos educação. E volto a dizer, não sou propriamente um adepto de academias e coisas do tipo, mas sou antes de qualquer coisa um amante da história, sobretudo a história viva, que presencio em todos os lugares, na minha vida, no dia-a-dia, no ponto de ônibus, num bar, ou numa Academia de Letras...

sábado, 14 de agosto de 2010

Poema.

nada a dizer
nada a dizer neste pequeno poema
pois nada me diz
o nada calou, infeliz
ou feliz
afinal, o nada
é!

(Niterói, 2009).

Poema.

uma gota de sol
varou a fresta da nuvem
choveu alegria
choveu luz

(Niterói, 2009).

Pele.

não quero conhecer nenhum grande mistério
obscuro, rude, abstrato
nada que represente, de repente, uma mudança nas estruturas
quaisquer estruturas
não quero saber sobre a maquina que é a estrutura
não pergunto nada sobre engrenagens
nem leis da natureza
nem leis humanas
não pretendo conhecer as ciências ocultas
de física quântica já me basta o que vejo na tv
talvez existam et’s e não estou nenhum pouco interessado nisso
não me preocupo também com o fundo do mar e as possibilidades que ele pode representa para os seres humanos
dos quais eu faço parte
pois parece que faço parte da humanidade também
não entendo quase nada de Sócrates
e nem de futebol
nem time do coração se quer tenho
queria saber apenas da pele
queria entender apenas a pele
e queria saber por que esta pele
me chama
me prende
me domina
que força é esta
porque não compreendo algo assim?
uma simples pele
que me consome
e me repele...

(08/01/2009)

Twittando a vida alheia!

Maquiavel disse que é melhor ter os inimigos próximos, que amigos, para poder vigiar-los. Será que é essa a estratégia do @PT_Para?

(...) isso deve explicar a proximidade com figuras como os Sarneys da vida em nível nacional. Ah saquei é tudo uma estratégia. Inteligente!!

A vã filosofia pequeno-burguesa pós-moderna diz que não existe mais esquerda X direita, pode ser, mas acho que não avisaram ao DEM e PSDB.

A propósito, esqueceram de avisar também à bancada ruralista que a luta de classes acabou (2º o pensamento pós-moderno). Santa ingenuidade!

@PMB_Oficial esta desativando urgências de postos de saúde da periferia de Belém. Argumentação: estudo mostrou não existir demanda (...)

Pergunto @PMB_Oficial : que raciocínio infeliz é este? Todo dia nos jornais vemos reclamações de falta de médico/remédio/atendimento (...)

@PMB_Oficial todos dias vemos PSM da 14 lotado e sem condições de atender a todos. Não há justificativa pra fechar urgências em Belém.

Pato foi convidado por Ganso para passar o Círio em Belém, mas declarou não se sentir muito seguro! (piada de cunho regionalista!)

Aos candidatos navegando no twitter declaro desde já que não voto nos partidos do campo de centro e direita, sobretudo nos do DEM, PSDB, PMDB

(...) não voto também nos partidos nanicos e de aluguel. Sendo assim os candidatos que seguirem este twitter, ficam desde já avisados!

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

3 poemas concretos regionalistas e um glossário!

1. Poema concreto regionalista amazônida:

Camarão com
Açaí
É bão!

2. Poema concreto regionalista amazônida suburbano:

A Terra Firme
Alagou
Na última chuva.

3. Poema concreto regionalista amazônida suburbano marginal:

Matinta-Pereira
Foi presa
Com um baseado
Na Ligação.



Glossário:

Açaí = Açaí com farinha. Comida típica da população ribeirinha, de pequenas cidades e de áreas suburbanas das grandes cidades da Amazônia. É comido juntamente com alimentos como camarão, charque frito, peixes, frango, etc.

Bão = Bom.

Terra Firme = Bairro onde moro. Periferia de Belém. Antes considerado o bairro mais perigoso da cidade. Terra Firme é na Amazônia um lugar não alegável, diferente de várzea. Mas, o Bairro da Terra Firme tem este nome pois tinha uma pequena área onde existia um campo de futebol. Era a única área no meio do mato que não alagava, daí ter ficado conhecida como o "campo da Terra Firme". O bairro ganhou o nome, mas tem muitas áreas de várzea, alagáveis. Assim como não tem os equipamentos urbanos dignos à população carente que lá vive.

Matinta-Pereira = Ser mítico das florestas e cidades pequenas da Amazônia. Mulher velha que se transforma em pássaro obscuro, sobrevoa as casas dos caboclos pedindo tabaco e dando um forte e tenebroso assovio: “Fiotíiiiiiii Mantinta Pereira!”. Diz-se ser de origem mitológica indígena. Cultuada pelos intelectuais e pseudo-intelectuais regionalistas que acham que falar do “povo”, estereotipando-o em poemas, livros e outras coisas, equivale a se redimir perante sua condição pequeno-burguesa.

Baseado = Maconha.

Ligação = Uma das ruas mais perigosas do Bairro da Terra Firme em Belém. Chegou a ser vista como a mais perigosa do Brasil em matéria do Jornal Nacional da Rede Globo. A periferia de Belém existe para além dos poemas que falam de peixe, rios, lua, etc.

Camelôs em Belém.

Mas uma vez a Prefeitura de Belém tenta resolver o “problema” do camelôs de Belém como caso de polícia. Expulsaram parte dos camelôs que ficavam nas proximidades do entroncamento. Gostaria de saber o que vai acontecer com estes trabalhadores de rua, vão ficar sem trabalho, sem espaço pra atuar?
Não custa lembrar que na última vez que a Prefeitura expulsou os camelôs da Av. Presidente Vargas a prefeitura demorou 3 anos pra entregar o camelódromo oficial, e este, por sua vez, não resolveu nem a metade do problema.
Estima-se que existam 10 mil trabalhadores de rua em Belém e de maneira geral nem a prefeitura de Belém nem o governo do Estado têm tratado esse assunto como um caso geração de renda e emprego.
É obvio que os camelôs atrapalham o transito, dificultam que cadeirantes, idosos, crianças, pessoas de todos os tipos andem nas calçadas. Isso é uma realidade. Mas é obvio também que agredir camelôs, expulsá-los dos locais centrais da cidade só vai colocar pras margens da sociedade quem já é das margens.
Geração de emprego e renda é um dever do Estado e da Prefeitura. Dar porrada em trabalhador de rua é uma violência, uma ação burra e irresponsável das autoridades constituídas!

Já falei sobre este tema antes: http://mimcomigomesmo.blogspot.com/2010/05/tem-prefeito-em-belem.html , quem quiser pode rever.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Praça da República: Praça da RES PUBLICA!

Uma das coisas que mais me aborrecem é o posicionamento conservador da juventude, de pessoas jovens. Não que jovens tenham que ser moderninhos, vanguardas, de esquerda, revolucionários, a favor da legalização da maconha ou coisa do tipo. Existem outras clivagens: de classe, de gênero, de religião, de convicção partidária, etc, etc.
Mas fico puto da vida quando tô no twitter e vejo frases do tipo:

“Se puta fosse bala e viado fosse fuzil, a praça da República estaria pronta para defender o Brasil”

Pra quem não sabe a Praça da República em Belém é o espaço da diversidade por excelência: lá se encontram os adeptos do Heavy Metal; os Emos; dependendo do horário, as prostitutas que ganham a vida nas redondezas; o boi-bumbá aos domingos de junho; os festivais de ópera que ocorrem no Teatro da Paz; o Bar do Parque, onde na década de 60, 70 e 80 intelectuais, políticos de esquerda, artistas de todas as tendências se reuniam pra fazer arte e contestar o Regime Militar; etc., etc.
Foi o espaço do famoso Festival de "Rock 24 horas", que ocorreu no início da década de 1990. Hoje, concomitantemente à transladação do Círio de Nazaré, ocorre o "Cirial", festival de rock e música alternativa que vai até o amanhecer no anfiteatro da praça.

Praça da República

A praça é também o espaço da Festa da Chiquita, que há mais de 30 anos (se não estou enganado com as datas) ocorre ao lado do Teatro da Paz, e que nos últimos anos tomou uma característica de afirmação dos movimentos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros (LGBT), etc. Por lá passa também a “Parada Gay”, todos os anos.
A Praça da República em Belém faz jus ao seu nome. RES PUBLICA vem do latim e quer dizer “coisa do povo”. Curiosamente lá está o que parece ser a única estátua de Marianne em todo o Brasil. Marianne foi o símbolo da liberdade, igualdade e fraternidade durante a Revolução Francesa.

Festa da Chiquita, ao lado do Teatro da Paz.

Recentemente no twitter a sujeira da praça também foi alvo de críticas. Acusaram os “arruaceiros” freqüentadores de fazê-la suja. Bom este argumento é no mínimo idiota. A praia de Copacabana no Rio, por exemplo, recebe milhares de pessoas aos fins de semana, mas no fim de cada dia vemos carros da prefeitura limpando a areia, recolhendo o lixo, etc. Talvez se houvesse uma coleta eficiente de lixo na cidade de Belém a praça não ficasse tão suja.
Por mais que um ou outro freqüentador exagere no uso da praça, jogando lixo onde não deve e coisas do tipo, nada justifica o preconceito aos seus freqüentadores, sejam eles LGBTs, roqueiros, Emos, prostitutas, etc. etc.
É triste ver jovens reproduzindo preconceitos tão banais em ralação a outros jovens freqüentadores das praças.
A Praça é do povo, como já disse o poeta! E é também da juventude de Belém. Homofobia é preconceito, discriminação, conservadorismo, ignorância, idiotismo, etc.
Por isso que reafirmo aqui: viva a diversidade da RES PUBLICA, da Praça da República. Longa vida a um dos espaços mais democráticos de Belém.

domingo, 8 de agosto de 2010

O sol nasce pra todos.

O sol nasce pra todos...
- Que lindo!
Com exceção dos que estão na chuva!
(10/09/09)

Minha autopsicografia

A Fernando Pessoa e Augusto dos Anjos


Se vejo o bom em tudo,
é porque o mau é mais obvio.
Se vejo algum desejo no ódio,
é porque percebo a circularidade das coisas.
Se percebo a mim em uma arvore,
é porque concebo as teorias da física moderna.
Tudo é e não é teatro:
atuo quando sofro, mesmo que eu sofra de fato.
Se olho para todos os lados o tempo todo,
é porque sempre espero alguma coisa boa acontecer.
Há em mim uma multiplicidade de formas.
Isto me deforma às vezes
ou me deixa amorfo outras tantas.
Há em mim um poço de possibilidades,
há em mim um caldeirão de combinações aleatórias.
Absorvo a água da chuva
e o vapor pequeno que sai do asfalto;
e tudo isso vaza em meu corpo.
Sinto todo o bem e todo o mal e não fico imune a nada;
não sou incólume aos sentimentos do mundo.
Talvez eu seja uma espécie de antena parabólica dos sentimentos soltos;
navego na alegria de forma tão livre
como afundo na tristeza mais medonha.

Disse certa feita:

“Hoje estou feliz,
aliás, felicíssimo!
Mentira! Na verdade estou triste,
mas, ainda não me dei conta disso”.

Noutra feita falei:

“Toda vez que me olho no espelho
estou padecido comigo mesmo.
E por este exclusivíssimo motivo,
sigo fingindo que não me conheço”.

Movimento no sol feio lagartixa,
espicho na sombra feito preguiça;
Intervalo-me, quase me desfaço.
Mas que ressurjo em pólvora e sangue
e areia movediça
Não me engano - Me engano! – com meus semelhantes.
Sou diferente de toda diferença.
Pergunto-me se em mim habita espírito humano
ou se existe apenas feiúra em minha doença?!
Mas, se incerteza se mostra mais provável,
provarei todo o mel-fel desta incerteza,
absorvo a alegria presente em cada tristeza
e a feiúra adjacente de toda beleza.
No buraco onde me escondo cotidianamente
observo tudo mesmo que não queira;
e do profundo fundo de minha moradia
Parece que grela uma semente de leveza.

(01 de outubro de 2008).

Amor/sexo/sexo/amor...

Nunca me beije
A não ser por volúpia
Nunca me abrace
A não ser quando a pele tua sentir sede
E pedir em cada célula meu corpo
Nunca me dê
A não ser que eu possa me colocar em tuas entranhas
Violar teu corpo e alma
Como um roubo, uma ação inesperada
Te causar prazer insuportável
E espanto
Nunca me dê
A não ser que a volúpia corte a carne pura
E liberte a puta mais barata em teu corpo pesado
Nunca me dê sem êxtase
Nunca me dê sem luxúria e beleza
Nunca me dê sem vontade insuportável
Sem a força de uma multidão insana no ato bárbaro e primário de matar a fome
Nunca me dê sem fome
Sem que me veja como o objeto
Único, por mais que efêmero, de teu prazer
A não ser que me ame
Em todos nossos muitos momentos efêmeros
Para que a eternidade de nosso amor se confirme em cada ato
(2002)

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

ABA leva tecnobrega e funk ao “Boteco das 11”: antropólogo pode!

Ontem foi o encerramento da ABA (associação Brasileira de Antropologia) que ocorreu na UFPA, em Belém. Nada a declarar em relação ao evento, não participei. Mas, curioso mesmo foi a festa de encerramento.
Os antropólogos do Brasil conseguiram levar o Funk carioca e o Brega paraense (dois gêneros musicais originários da periferia do Rio de Janeiro e de Belém, respectivamente) ao “Boteco das 11”, um dos mais aristocráticos bares de Belém.
No “das 11” se reúne a burguesia local (supostamente culta e refinada) pra tomar sua cervejinha de fim de tarde. O bar fica no bonito complexo “Feliz Lusitânia”, no centro antigo de Belém. Local cercado de museus e à margem do Rio Guamá e Baia do Guajará.
Provavelmente foi a primeira e a última vez que o brega ou o funk tocaram e foram dançados (com desenvoltura, diga-se de passagem) naquele bar. Curiosamente até a cerveja estava relativamente barata: na madrugada os garçons já anunciavam 2 latinhas por 5 reais. E corriam de isopor na cabeça de lá pra cá, de cá pra lá, gritando: “2 latinhas por 5, 2 por 5!”. Parecia mesmo uma festa de “aparelhagem”!
Pra mim este fato inusitado nos mostra ao mesmo tempo a contradição dos intelectuais e da elite brasileira.
De um lado mostra que muitos antropólogos (mas também historiadores, sociólogos, literatos, artistas, jornalistas, etc.) fetichizam a figura do “popular” e do “popularesco”. Em muitos casos (obviamente que não em todos!) os intelectuais cultuam o “outro” (o pobre, o caboclo, o caiçara, o ribeirinho, o índio, o negro, o nordestino, etc.) contanto que este “outro” permaneça sob controle, higienizado, permaneça “em seu devido lugar”. Falo isso porque nunca que aconteceria da presença dos produtores e consumidores originais de brega e do funk no “Boteco das 11”.
O brega e o funk só ocorreram naquele lugar porque era uma versão “branca” e “civilizada” de uma “festa de aparelhagem”, caso contrário os seguranças teriam colocado os “bregueiros” e “funqueiros”, da periferia, todos pra fora do bar!
É bom lembrar que boa parte da elite paraense, assim como boa parte da elite brasileira, vê gêneros musicais como o Brega ou o Funk como lixo cultural.
É bom lembrar ainda que isso ocorreu também com o samba, que no início do século XX era visto como um batuque bárbaro de gente desqualificada e perigosa. E mesmo com o carimbó que até o início do século XX era inclusive proibido de ser tocado, pelos códigos de postura de municípios como Belém e Vigia:

Código de Postura do Município de Belém em 1880:

“Artigo 107: É proibido, sob pena de 30.000 reis de multa:
Parágrafo 1º - Fazer bulhas, vozerias e dar autos gritos sem necessidade.
Parágrafo 2º - Fazer batuques ou samba.
Parágrafo 3º - Tocar tambor, carimbó, ou qualquer outro instrumento que perturbe o sossego durante a noite, etc.”
(Citado em SALLES, Vicente e SALLES, Marena Isdebski. Carimbó: trabalho e lazer do caboclo. In: Revista Brasileira do Folclore. Rio de Janeiro, 9 (25), set./dez. 1969 p. 260)


Por outro lado, o evento de ABA prova também o quanto a elite de Belém (e do Brasil de maneira geral), que renuncia o brega, o funk, etc., é tacanha e colonizada. São “caboclos querendo ser ingleses”, como disse uma vez Cazuza. Adoram ser moderninhos e vanguardas ouvindo músicas que estejam na moda em Londres, Toquio ou N. York. Porém muitos destes estavam alegremente se balançando ao som do tecnobrega e do funk, fantasiados de antropólogos. Pois antropólogo pode!
Agora temos que esperar outro grande encontro acadêmico na cidade para os espaços da elite serem ocupados pela música suburbana local.
Enquanto isso o brega e o funk ocupam seu espaço, a partir da margem, onde a cultura pulula, sem a ordem, sem a “higienização” de um espaço como o “Boteco das 11”. Mostrando que a cultura popular subalterna, por mais que possa ser criticada em muitos aspectos (o que é necessário que se faça também!), não precisa ser exotizada e fetichizada para fervilhar!

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Lapa: cenas do cotidiano boêmio!

a mala

uma malha fedida sobre a mesa
surge o debate
será fedor de urina ou de mofo?
em meio a falas uma voz se destaca, grita:
- pô cara é uma mala cênica! foda-se, é uma mala cênica!
dito o dito, o cigarro volta à vanguardista e jovem cara barbada
vanguarda é assim mesmo,
junta mala velha na rua para ser descolado
e diz que achar na rua é melhor que comprar
- é outro lance!
fumo chupado na boca barbada...
velhinho de bigode e dentes escassos
toma cerveja sozinho e sossegado
teria sido de alguma vanguarda nalgum dia?
na mesa ao lado, a mesa da mala fedida,
alguém diz:
- cara se a gente coloca o espetáculo na net, pode ser que vire sucesso mundial...
e quem sabe não vira mesmo!
ora vanguardas são sempre iguais
seja na lapa no Rio, seja no bar do parque em Belém
certo é o velhinho que toma cerveja sossegadamente?
talvez agora só pense nos dentes que perdeu!

19/03/09

domingo, 1 de agosto de 2010

Um poema de Márcio Galvão sobre o tempo.

RUGAS (AS PARTITURAS DOS MEUS DESENGANOS)

No impaciente suceder dos anos,
Percebo os dias como sanguessugas
Que me imprimem, na epiderme, as rugas,
Quais partituras dos meus desenganos.

O tempo, este maestro soberano,
Regente da charanga desta vida,
Nutre um comportamento de homicida,
Sem nunca mensurar perdas e danos.

As horas cantam sem eira nem beira,
Gritando que os ponteiros são bandidos,
E eu nunca voltarei aos tempos idos,
Tal qual despertador de cabeceira.

MÁRCIO GALVÃO