sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Considerações intempestivas sobre as vantagens da morte

Em verdade a morte é o grande dia da vida de qualquer pessoa, já que em geral todos os seus erros são perdoados e se ele for uma pessoa pública ou conhecida na sua redondeza vão aparecer depoimentos e depoimentos dizendo que ele foi um bom homem ou uma boa mulher.

De fato, até os inimigos nessas horas costumam chorar sobre o caixão do antigo adversário e proferem discursos voltairianos do tipo: “Não concordo com uma palavra do que dizias, mas defenderia até o último instante seu direito de dizê-la, caso você estivesse vivo. Porém, tendo em vista que você está morto, tanto faz como tanto fez!” (obviamente que essa última parte é falada em silêncio, para que os familiares não percebam!).

Esses depoimentos são apenas uma das vantagens de se estar morto. Outras ainda podem ser citadas. Pois vejamos:

O café! Velório que é bom tem que ter café! E muito café! E baralho também. Na verdade o café acompanha o baralho da mesma forma que as velas acompanham o morto. Sobretudo nos velórios populares que já participei, o baralho é quase tão importante quanto o defunto, e quanto o café. Diria até que muitos jogadores de baralho esperam ansiosamente o vizinho moribundo morrer para garantir pelo menos uma noite inteirinha dedicado ao seu jogo preferido (sem que a sociedade o condene como viciado e vagabundo). Deve-se considerar ainda que a economia de café nas casas da vizinhança do defunto é muito grande nessas 24 horas de velório, o que contribui sobremaneira para o bem estar social!

O piadista é outra coisa que não pode faltar. O piadista é o cara que mesmo estando sofrendo com a morte do defunto, tem o altruísmo de falar coisas engraçadas (às vezes até as peripécias do defunto em vida!). O piadista, poucos sabem, tem um grande papel em nossa sociedade e na vida dos mortos, ou, melhor dizendo, na hora da passagem dessa pra melhor. Ele é um elemento ambivalente, uma espécie de palhaço trágico, que garante que mesmo na hora do sofrimento os entes queridos do defunto consigam rir um pouco, lembrar dos bons momentos da vida com o defunto, e até, quem saber, chegar à conclusão de que na verdade o dito cujo já vai mesmo é muito tarde (isso apenas em casos mais extremos, obviamente!)!

Antigamente também era comum a presença de mulheres carpideiras, que iam pra chorar sobre o caixão do morto. Era muito romântico, mas parece que ficou como uma coisa do passado! Em alguns casos temos também a presença do próprio morto avisando aos entes queridos de que morreu. É o famoso fantasma da alma recém-desencarnada! (aproveito esse espaço e aviso desde já que não farei essa sacanagem com meus amigos e familiares. Ao morrer, caso eu não desapareça por completo, prometo não puxar o pé de ninguém à noite e nem me manifestar como alma penada. Qualquer aviso que tenha pra dar, deixo por escrito aqui neste blog para conhecimento público, antes de morrer).  

É importante considerar ainda que o cidadão em desacordo com a condição de vivo, vulgarmente conhecido como defunto, tem direitos inalienáveis que devem ser garantidos! Falta-nos ainda uma declaração universal dos direitos dos homens e mulheres mortos, mas de certo que entre os direitos e deveres do defunto então a existência de um caixão, um buraco na terra pra ser enterrado, direito a não ser comido (a não ser em casos de acidentes de avião em regiões isoladas e geladas do globo e se forem europeus invasores de terras indo-americanas!), direito a feder, mesmo depois de tomar o último banho, e a apodrecer!

Mas, caros leitores, a essa altura do campeonato vocês devem estar se perguntando por que estou falando de tudo isso? Ocorre que hoje de manhã acordei com a seguinte frase na cabeça: “a morte é em verdade o grande momento da vida de qualquer pessoa!”.

Isso porque além de todas essas sociabilidades que já falei acima, a morte é também a grande chance para, caso exista céu, irmos ao encontro do onipotente, oniciente e onipresente! E caso não exista céu vamos simplesmente deixar de existir.

Ora meus caros, o que a maior parte das pessoas não percebeu ainda é que deixar de existir não é propriamente uma coisa má. Na verdade não é também uma coisa boa. Na verdade não é nada! A não existência não tem cheiro nem sabor, não dói nem dá prazer, não é audível nem é silenciosa, nem quente nem fria, nem doce nem amarga, nem azeda nem salgada, nem chuva nem sol, nem inverno nem verão.

A não existência é simplesmente o que ela não é, ou seja, não é, é nada, em sendo um não ser, o não existir, nada faz ou desfaz, somente é o seu não ser, o que nem sequer se pode definir!

Neste sentido, morrer do ponto de vista da sociedade que cerca o indivíduo morto é um bom negócio, por todas as benesses que já expus (piadistas, elogios ao defunto; sem contar outros temas como o crescimento da economia de caixões e flores, a possibilidade do viúvo ou viúva trocarem de cônjuge, etc.).

E do ponto de vista do morto, ele terá as possibilidades de ir para o céu ou simplesmente deixar de existir.

Não coloquei a categoria inferno ou diabo de chifres e tridente nesse debate, pois acho que esse papo de inferno é contemporaneamente uma invenção de Edir Macedo e Cia. E não vou dar ibope pra esse tipo de gente que dá mais moral para o diabo do que pra Deus! Sem contar que se deus existir mesmo, e se for um cara maneiro, ele vai chegar à conclusão de que foi ele quem colocou a gente nessa enrascada toda, e agirá com justiça e perdoará todo mundo para garantir a paz celestial eterna no paraíso. Bom, mas isso caso deus exista! Eu, de minha parte, ainda sou adepto da tese de que depois que a gente morre viramos “nada” mesmo!

Então meus caros, tendo em vista o exposto, diria que morrer não é tão ruim assim. E defendo a tese de que morrer é o momento mais importante da vida de qualquer cidadão! O que dá a nós, seres vivos, a grande vantagem de um dia deixarmos de existir, em superioridade às pedras, por exemplo, que estão condenadas à eterna existência, em decorrência da ausência da morte!

Essa é, portanto, mais uma vantagem que nós temos, e não uma desvantagem, como pode parecer à primeira vista.

Então, se você é como eu, uma daquelas pessoas que vai morrer algum dia, lhe desejo que aproveite a sua morte da melhor forma possível, pois que eu saiba ela só acontece uma vez na vida, digo, na morte, e por isso mesmo tem que ser valorizada!

Sem mais, nos encontramos por aqui. A não ser que eu, ou um de vocês, morra!

Amém, pra quem é de amém; sarava pra quem é de sarava!

terça-feira, 25 de setembro de 2012

Morreu Mestre Cupijó! Viva Cupijó!


Aviso: Esse texto é uma parte do terceiro capítulo de minha dissertação que tratou da música em Belém nos anos 1960-1970. Esse fragmento fala de Cupijó. Caso alguém se interesse, a dissertação completa esta aqui: http://www.ufpa.br/pphist/images/dissertacoes/2008/2008_tony_leao.pdf
As notas são originais, qualquer dúvida sobre as fontes citadas basta procura-las na bibliografia da dissertação.

*****


Um terceiro “mestre” importante neste período [anos 1970], não necessariamente do carimbó, mas do siriá, foi Joaquim Dias de Castro, ou simplesmente mestre Cupijó, como ficou conhecido. Segundo o que consta, o nome Cupijó surgiu em sua infância no município de Cametá, na região do baixo Tocantins. Como era um garoto doente até certa idade e não podia consumir comidas sólidas, vivia a reclamar para seus pais dizendo que iria fugir para o rio Cupijó, caso não lhe dessem a alimentação que queria. Resultado disso foi que a sua família acabou o apelidando pelo nome do rio que ele dizia que iria fugir. Surgia assim o nome pelo qual ele ficou conhecido desde o início de sua carreira [i].
Cupijó também vinha de uma família ligada à música. Ele era filho de Vicente Serão de Castro, figura importantíssima da música do município de Cametá. Seu pai nasceu em 1891 e foi remanescente do apogeu daquela cidade tocantina na época do intendente Heitor de Mendonça. Vicente Serrão de Castro foi regente da tradicional Banda de Música Euterpe Cametaense, e mestre-capela e regente do Coro Lira Angélica. Foi autor de vasta obra, em que constavam valsas, serenatas, quadrilhas, dobrados e música sacra [ii].
Graças a isso Cupijó teve contato muito cedo com a música. Seu primeiro instrumento foi o surdo, depois o prato, mas desde muito novo aprendeu segundo a leitura de partitura. Mais tarde aprendeu a tocar banjo, bateria, clarinete e violão. Tocou na Banda Euterpe Cametaense, a mesma que foi dirigida por seu pai. Sua estréia como músico se deu tocando bateria em um conjunto de propriedade de seu pai, o “Ases do Ritmo”, em um baile de fim de ano, em 1960 [iii].
Em 1961 passou a dirigir a Banda Euterpe, já que seu pai havia falecido, e também passou a atuar definitivamente no “Ases do Ritmo” nos aos 70. Além disso, dedicou-se a ensinar música gratuitamente, tendo uma escola de música em sua casa. Também dirigiu por certo período o coral da Matriz da Prelazia de Cametá.
Em 1973 lança o siriá em LP pela primeira vez, ao mesmo tempo em que o carimbó estourava no mercado regional. Em 1975 já chegava com o siriá a várias áreas do Brasil. Nesta época, seu terceiro disco, “Mestre Cupijó e seu ritmo”, foi gravado pela gravadora Continental.
Mesmo no período de maior divulgação do siriá, Cupijó dizia preferir o sossego de sua cidade interiorana. Não gostava muito de ir a Belém e a outras cidades maiores, só o fazia devido às necessidades inerentes à sua carreira. Essa badalação da cidade grande estava ligada também à badalação dos ritmos da moda. Neste sentido ele dizia que preferia o siriá “autêntico”, que ajudou a difundir. Falava ainda que talvez mais adiante começasse a ocorre com o siriá o mesmo que estava ocorrendo com o carimbó. Reclamava que o interesse dos mais “espertos” na busca do lucro estava se sobrepondo ao interesse da “autenticidade”. É importante observar que Cupijó se dizia um artista da música folclórica e não da música popular. Arrematava: “hoje o siriá é mais verdadeiro porque é menos sofisticado”[iv]. Cupijó se dizia um divulgador do folclore paraense, uma pessoa ligada por vivência a esse folclore: “Moro no interior, vivo, danço, conheço, bato tambor, toco, pino (...) sei a linguagem do homem do interior, converso com ele e vivo minha vida como um homem do interior”[v]. Daí que tinha forte aversão aos músicos da capital que tendiam a ir ao interior para conhecer as músicas daquela população com os seus gravadores na mão e depois gravavam como se fossem suas. “E não há nenhuma providência sobre esse comportamento. O Folclore deve ser visto como cultura do povo, anônimo”[vi] - concluía a este respeito.
É interessante observar que esse tipo de reclamação não foi exclusividade de Cupijó. A ida de músicos da cidade aos pequenos municípios e áreas rurais em busca da coleta do carimbó parecia ser um fato rotineiro neste momento. E isso acabava levando expectativas de ganhos financeiros e reconhecimento por parte dos tradicionais criadores, que após algum tempo não viam o resultado de seu trabalho aparecer. Com o passar dos anos, muitos compositores de carimbó começaram a se recusar a dar entrevistas ou a cantar suas músicas a pessoas que chegavam com gravadores ou câmeras de TV. A desconfiança se dava, pois para os criadores interioranos a presença destes “pesquisadores” poderia significar por um lado o registro acadêmico ou folclórico do carimbó, mas, na maior parte das vezes, significava a simples coleta para gerar gravações de discos onde as músicas apareceriam depois como de “domínio público”. Para o criador que acabava criando expectativas de algum ganho econômico ficava a decepção e desconfiança com qualquer um que viesse da cidade grande em busca de conhecer e registrar o carimbó [vii].
Cupijó ficou conhecido como o principal divulgador do siriá, música aparentemente originária do município de Cametá. Segundo a interpretação de alguns antigos moradores de Cametá entendidos no assunto, o siriá seria na verdade uma espécie de batuque aparentado com o carimbó. Para Mario Martins[viii], que era uma espécie de pesquisador da música cametaense, o nome siriá teria na sua origem o termo cereal, que com o passar do tempo ficou sendo conhecido pela população da cidade como a corruptela siriá. Seria uma criação tipicamente da cidade de Cametá. Para outros, a palavra síria tinha origem no local onde os escravos de Cametá pescavam o siri. Assim como teria ocorrido com palavras como “canaviá”, originária de canavial, e “arrozá”, de arrozal, teria surgido uma palavra, siriá, para referir-se ao local de pesca do siri, num processo de corrupção da palavra junto às comunidades pobres [ix].
Do ponto de vista musical, o siriá tinha proximidade com outras manifestações folclóricas como o marabaixo de Macapá[x] e mesmo o carimbó. Na opinião de Cupijó, a diferença maior entre carimbó e siriá estava relacionada à maneira como se dançavam cada ritmo, já que o siriá veio principalmente do roçado, do mutirão, sendo uma dança para grandes espaços, onde os movimentos de corpo acompanham a letra da música. Esse trabalho corporal de que falava Cupijó era conhecido em Cametá como “caianas”[xi]. Outras diferenças ainda segundo Cupijó seriam derivadas de uma maneira especial de tocar o curimbó - tambor - no siriá. Nele o tocador que está em cima do instrumento faz um movimento de calcanhar, ou mesmo de ponta de pé, sobre o couro, em sua parte inferior, abaixo de onde as suas mãos estão funcionando como baquetas, esfregando-o. Este movimento modifica a afinação do instrumento na hora de tocá-lo. Por fim, no mesmo tambor, que chega a ter até 2 metros de comprimentos, em que um tocador bate no couro com a mão em uma das extremidades, há uma segunda pessoa que batuca na madeira do tambor com pequenas baquetas de madeira rija, acompanhando o som que sai do couro[xii]. Para Cupijó, essas seriam as principais diferenças, mas como vimos acima isso ocorre também no carimbó, como por exemplo naquele feito por Verequete. O certo é que carimbó e siriá surgem e se tornam populares ao mesmo tempo, em um mesmo processo de valorização das músicas populares do interior.
Em junho de 1971, no jornal “Cametá”, José de Assunção elogiava o prefeito da cidade por colocar o Siriá nas festividades oficiais. Dizia que até aquele momento o siriá era uma música que existia apenas na parte profana e não oficial das festividades municipais, sobretudo nas zonas rurais. Não era tocado para a “sociedade” do município, apesar de sua longa existência que remontava ao período colonial, provavelmente de criação negra e indígena. Falava ainda que já era tocado com os “jazz”[xiii] nos “salões sociais”, mas que mantinha contudo suas características originais[xiv]. No mesmo período em que o carimbó começava a ganhar espaço em Belém, ocorria um processo parecido em Cametá com o siriá.
Em Cametá, o carimbó e o siriá no início de sua popularização eram tocados apenas no final das festas. Mas no momento máximo de sua difusão, o grupo de Cupijó chegava a tocar em 10 municípios do estado em um curto período de tempo. Apesar disso, os músicos do grupo nunca deixaram seus empregos, já que mesmo com tantos shows, diziam não ser possível viver de música por volta de 1973 [xv].
Em Belém, o siriá de Cupijó, assim como ocorreu com Pinduca, apareceu e conquistou espaço primeiramente nos clubes de subúrbio, como o Imperial e o Satélite, por exemplo. O Siriá aparece em Belém mais ou menos no mesmo período que o carimbó. No início dos anos 70 já se comentavam sobre esse novo gênero musical que vinha do interior do estado, mais particularmente do município de Cametá. Contudo, a postura de parte da intelectualidade e juventude em Belém será diferenciada em relação a Cupijó. Pinduca era visto por parte destes setores como uma espécie de deturpador do carimbó, por ter colocado em seu conjunto instrumentos modernos, como guitarra e baixo elétrico, e bateria. Já a visão sobre Cupijó foi outra, bastante boa desde o início, pelo menos é o que podemos perceber em um artigo escrito por Paes Loureiro no jornal Folha do Norte em 1973 [xvi].
Neste texto, Paes Loureiro reconhece em primeiro lugar a longevidade do siriá que lutou para sobreviver “durante longo anonimato”. Reconhece também o município de Cametá como uma cidade culturalmente muito importante na região, por ser “o manso território onde lutam contra o tempo e a indiferença, as últimas verdadeiras manifestações de nossa tradição popular”[xvii]. Mas o que fica fortemente visível em seu texto é a importância singular atribuída ao “Mestre Cupijó”, que aparece quase como um herói defensor da cultura e do povo da região. Aliás, de fato torna-se um herói no discurso Paes Loureiro já que é comparado a Pedro Teixeira, que realizou a fantástica aventura de navegar o Rio Amazonas em sua totalidade entre os anos de 1637 e 1638 [xviii], e também é relacionado à cabanagem que teve em Cametá um ponto de apoio muito importante [xix]. Assim comenta Paes Loureiro:

Mestre Cupijó reeditou Pedro Teixeira, aquele que conheceu o Rio das Amazonas, trazendo até nós, para nosso conhecimento, a alma de sua cidade, que no seu sopro confere vida ao barro primitivo de uma alegria, a que a luta brava da civilização começa a nos desacostumar.
Nele (...), entre barrancos de bemóis, corre o lento rio Tocantins, piscoso de lendas e mistérios; (...) nele brincam as crianças humildes de Cametá, fazendo cirandas em sustenidos e bequadros; nele se ergue a Cabanagem em punhos, deflagrando tambores e alegorias; nele percorre, na veia das melodias, o sangue legítimo da verdade popular (...).
Mestre Cupijó toca pelo amor de tocar. Ainda não aprendeu a vender a sua arte, porque seria mercadejar a sua alma [xx].

E a recíproca parecia ser verdadeira. Em 1976, referindo-se ao contexto musical de Belém, e à questão da difusão da música “folclórica” e popular paraense, Cupijó tece observações elogiosas à nova geração de músicos que surgia, assim como a artistas já de velha história. O relato a seguir é interessante para percebermos que artistas como Cupijó, do interior, aparentemente com pouco contato com o mundo das classes médias urbanas e seu meio cultural, reconheciam o papel desse grupo na construção de uma música popular com feições regionais. O reconhecia como grupo, sobretudo, onde encontrávamos desde o veterano Waldemar Henrique até os novatos. Ele dizia:


“Penso que nosso estado é muito feliz. Não apenas no campo folclórico, ao qual eu pertenço, como, também, na música popular. Chego mesmo a pensar que no Pará se pinta uma nova interprete nacional, com Fafá de Belém. E os compositores como Waldemar Henrique, Paulo André Barata e Paes loureiro, Vilar, Proença, foram uma constelação que muito me anima lá pelo meu interior [xxi].


[i] LIMA, Elza. Cupijó: mestre do cancioneiro popular. O Liberal, Belém, 01 ago. 1993. Caderno 3, p. 10.
[ii] SALLES, 1985, op. cit.
[iii] Mestre Cupijó lança CD para comemorar carreira. O Liberal, Belém, 28 ago. 1999. Caderno Cartaz, p. 6.
[iv] COUTO, Jesus. Hoje, siriá ao vivo, em Belém. A Província do Pará, Belém, 10 abr. 1976. 2º Cad., Transa Musical, p. 6.
[v] Ibidem.
[vi] Idem. No mesmo sentido, outra entrevista de Cupijó in: Mestre Cupijó, o rei do siriá, está elaborando o seu quinto LP. A Província do Pará, Belém, 15 jul. 1977. 1º Cad., p. 7.
[vii] Um outro exemplo de indignação sobre esse tipo de atitude pode ser visto no depoimento de D. Zazá, amiga de Mestre Lucindo, um popular criador de carimbó do município de Marapanim que se tornou conhecido em Belém já nos anos 80. D. Zazá chega inclusive a dizer que a partir de certo momento se recusaria a dar entrevistas ou a cantar o carimbó para qualquer pessoa que fosse até ela a não ser que fosse paga por isso. Dizia ainda que durantes anos seguidos eles teriam apenas recebido promessas de gravação e de recebimento de direitos autorais, coisa que nunca acontecia. Cf. Entrevista com D. Pequenina (esposa de mestre Lucindo) e D. Zazá. Museu da Imagem e do Som do Pará. (FV 91/12). Estas entrevistas parecem ter sido feitas nos anos 90, após a morte de Lucindo.
[viii] SILVA, Coely. Entrevista à Mario Martins: As verdades históricas do carimbó, que é “curembó”. O Liberal, Belém, 23 jul. 1974. p. 8.
[ix] MODESTO, Márcia. A influência negra na dança e no canto paraense. Cultural, Belém, set. 1988. p. 8.
[x] Batuque e dança de mestiços e negros do estado do Amapá. Sua área de maior incidência é a cidade de Mazagão Velho e o bairro do Laguinho, onde ficava o antigo quilombo do Curiaú. Cf. SALLES, 2007, op. cit. p. 198.
[xi] MARIA, Luíza. Cupijó o mestre do siriá, op. cit.
[xii] COUTO, Jesus. Siriá é lançado para todo o Brasil através da Continental. A Província do Pará, Belém, 20 abr. 1975. 2º Cad., Transa musical, p. 5.
[xiii] Em muitas cidades do interior, as bandas de baile dos anos 40, 50 e 60 eram conhecidas por jazz ou “jazzes”. Eram na verdade fruto da popularidade de bandas instrumentais, com presença de muitos instrumentos de sopro, que foi comum em todo o Brasil a partir do dos anos 30. Cf. SALLES, 1985, op. cit.
[xiv] ASSUNÇÃO, José. Siriá. Cametá, Cametá, 23 jun. 1971. Opinião, p. 5.
[xv] MARIA, Luíza. Cupijó o mestre do siriá. O Liberal, Belém, 25 nov. 1973. 3º Caderno, p. 9.
[xvi] LOUREIRO, João de Jesus Paes. Mestre Cupijó. Folha do Norte, Belém, 12 abr. 1973. 2º Caderno, p. 1.
[xvii] Ibidem, p.1.
[xviii] A famosa expedição de Pedro Teixeira fez parte do processo de conquista e ocupação da Amazônia pela coroa portuguesa, num momento em que nações estrangeiras ameaçavam ocupar definitivamente o território português nestas terras, particularmente os franceses que já haviam fundado a cidade de São Luis do Maranhão. No processo de expulsão destes povos e de conquista - nada amistosa como se sabe - dos indígenas ocorreu esta expedição. Entre 1637 e 1638 setenta soldados e mil índios liderados por Pedro Teixeira, partiram de Cametá, navegando pelo rio Amazonas até seu alto curso, penetrando nos rios Napo e Coca. Desta parte em diante os expedicionários foram por terra e alcançaram à cidade de Quito, que na época era a capital do Vice-Reino do Peru. Cf. NETO, José Maia Bezerra. A conquista portuguesa da Amazônia. In: FILHO, Armando Alves; JÚNIOR, José Alves; e NETO, José Maia Bezerra. Pontos de história da Amazônia, v. I. Belém: Paka-Tatu, 2001.
[xix] Cabanagem: movimento insurrecional ocorrido no Pará entre 1935 e 1940, que teve forte atuação das camadas populares contra as elites locais. É considerado como um dos maiores movimentos revolucionários populares do período imperial brasileiro. Cf. NETO, José Maia Bezerra. Cabanagem a revolução do Pará. In: FILHO, JÚNIOR e NETO, 2001, op. cit.
[xx] LOUREIRO, João de Jesus Paes. Mestre Cupijó, op. cit.
[xxi] COUTO, Jesus. Hoje, siriá ao vivo, em Belém. 1976, op. cit, p. 6.

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

A escola que que foi apelidada de "presídio"

No desfile escolar da Terra Firme o locutor anunciou que está em fase de licitação a construção da Escola Celso Malcher. Será que é verdade ou não passa de mais uma propaganda do governo do estado sendo feita bem antes da obra sequer começar?? Perguntar não ofende! Principalmente em época de eleições.

Comecei e trabalhar nesta escola logo que ela abriu. Era um galpão, onde antes existia uma quadra de futebol de salão. Era quente como o inferno, com paredes de compensado separando as turmas. Quando chovia caia mais chuva dentro do que fora. Para terem uma ideia de como eram as condições do lugar, os alunos das outras escolas do bairro apelidaram o local de “presídio”, o que constrangia muito os estudantes, funcionário e professores do Celso.

Ela foi inaugurada no governo do PSDB (Se não estou enganado foi na transição do governo Almir Gabriel - PSDB - para seu sucessor e agora novamente governador, Simão Jatene - também PSDB). Brigamos muito pra que o governo fizesse uma escola nova. Foram dezenas de reuniões com técnicos da SEDUC, idas à SEDUC, assembleias, etc. Participei de boa parte desses eventos, depois saí da escola. Passou-se um bom tempo e o governo colocou a escola no prédio da paróquia de São Domingos de Gusmão. Prédio um pouco melhor do que o anterior, mas alugado. Graças à bondade do Padre Bruno.

Fora da escola sempre ouvia os boatos: agora vai sair escola nova, já compraram o terreno, já ta com a verba garantida, etc. Nunca vi de fato isso ocorrer! Tomara que ocorra agora.

Mas na melhor das hipóteses, torcendo pra que seja construída uma nova escola no bairro, uma coisa já está clara: O desrespeito do governo do PSDB, sobretudo, pela educação do estado. Colocar crianças do ensino infantil e fundamental num galpão quente e úmido, um “presídio” como foi apelidado, é no mínimo não ter compromisso nenhum com a educação pública!

A eleição está ai. O governo diz que seu candidato à prefeitura de Belém vai trabalhar junto com o Estado, fazendo as mesmas políticas. Será que novas escolas da administração municipal teriam então o mesmo modelo da Celso Malcher caso ganhasse o candidato do PSDB?!

Medo!

Teríamos então novos “presídios” nas periferias de Belém?

Nem sei se a obra vai sair mesmo. Tomara que desta vez aconteça (e já esperamos por mais de 10 anos)!
Ficarei feliz por isso, mas não esquecerei a indignidade de como a educação no Pará é tratada pelo governo tucano!

Espero que os ex-alunos, muitos dos quais ainda me cumprimentam quando me encontram na rua da Terra Firme, pais e professores lembrem disso na hora de votar!

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Sobre a greve dos Trabalhadores da Construção Civil


Hoje pela manhã passei no ato organizado pelo Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil de Belém. Fiquei impressionado com a capacidade de organização dos trabalhadores. Acho que havia mais de 6 ou 7 mil operários na frente da FIEPA, na Quintino Bocaiuva. Fora os operários que estavam mobilizados na Av. Augusto Montenegro, que segundo fotos que me foram mostradas, pareciam em número igual ou maior.
Os professores da UEPA, que estavam mobilizados em frente ao Centro Integrado de Governo (CIG), foram prestar sua solidariedade ao movimento operário e no final do ato os operários passaram na Av. Nazaré, onde estávamos concentrados, em retribuição. Foi um momento muito forte, até emocionante eu diria!
Os “peões” são historicamente considerados cidadãos de segunda categoria no Brasil. Carregamos ainda o fardo da herança escravocrata que nos deixou com a visão deturpada sobre o trabalhador braçal. Quem exercia esse tipo de trabalho no período colonial e mesmo depois disso eram os escravos, assim como os demais grupos marginalizados da sociedade brasileira: índios, mestiços e pobres.
Até hoje esses trabalhadores, homens e mulheres, são vistos como sub-cidadões, são necessários apenas na medida em que fazem o serviço pesado e braçal, que os “cidadãos de bem” não se dispõe a fazer! Podemos dizer que são pessoas invisíveis para o restante da sociedade: são os operários que só aparecem nas piadas de “cantada de canteiro de obra”, são os garis que correm pelas ruas das cidades, anônimos, são as pessoas que limpam nossas casas, arrumam nossos quartos, constroem nossas casas, são todos aqueles que muitas vezes não tem sequer o “privilégio” a um “bom dia”, mesmo que por pura educação!
Hoje quando estava em cima do carro som em meio aos operários, acompanhado de outro professor que falou algumas palavras de solidariedade ao movimento, pude perceber quem eram esses homens (neste caso a maioria homens e a minoria mulheres): são negros, mestiços, caboclos, pobres, bronzeados pelo sol, calejados pela lida diária de trabalho duro; são pais de família ou não, muitos são jovens, outros com rugas que como camadas arqueológicas nos indicam quantos prédios já ergueram, quantas cidades já construíram; são moradores do Tapanã, do PAAR, da Terra Firme, do Guamá, do Jurunas, etc.; muitos desses dependem das ciclovias, inexistentes na maioria das ruas da cidade, pois a passagem de ônibus lhes pesa no orçamento mensal; se equilibram no trânsito intenso da cidade, correndo o risco de não chegarem aos canteiros de obra, onde as bicicletas, centenas encostadas umas sobre as outras, são um sinal claro de que temos duas cidades: a cidade do povo que precisa se equilibrar pra sobreviver e a cidade dos carros e condomínios de luxo. Na Avenida Augusto Montenegro, para onde a cidade de Belém mais cresce, são os moradores das favelas e “ocupações” que ficam ao fundo, nos bairros pobres – fruto da luta prática dos trabalhadores –, e nas franjas da avenida constroem os condomínios e os shopping centers que vão atender a nova classe média e a elite paraense!
Essas são mais algumas facetas de nossa sociedade: autoritária e hierarquizada, desigual e excludente!
De fato são esses operários que constroem a metrópole da Amazônia, mas ao mesmo tempo são excluídos do direito de cidadania! São os personagens reais daquela música de Zé Geraldo, “Cidadão”, gravada e regravada, entre outros intérpretes por Zé Ramalho.

Tá vendo aquele edifício moço?
Ajudei a levantar
Foi um tempo de aflição
Eram quatro condução
Duas pra ir, duas pra voltar
Hoje depois dele pronto
Olho pra cima e fico tonto
Mas me chega um cidadão
E me diz desconfiado, tu tá aí admirado
Ou tá querendo roubar?

Os operários não querem roubar, querem apenas o que lhes pertence por direito, e mais, querem o que pertence a todos os homens e mulheres: trabalho honesto com salários e condições de trabalho justos e decentes. E parece-me que estão dispostos a tomar o que lhes pertence. Mostrando que a “classe trabalhadora” permanece viva, mesmo que muitas vezes anestesiada por representantes que mudam de lado ao chegar ao governo.
Acho que em termos de Belém os operários da construção civil são hoje a categoria mais mobilizada e consciente de suas dificuldades e necessidade de luta. Em boa parte isso se deve ao sindicato e a militância do PSTU, que é majoritário na sua coordenação. Neste sentido Cleber Rabelo (assim como Atenágoras Lopes e outros dirigentes) se destaca como uma liderança orgânica e legítima! Operário como todos os demais operários presentes; é mais um peão que constrói a cidade que cresce, mas está excluído desta mesma cidade, pois não tem os direitos mínimos garantidos por lei e é desrespeitado em sua dignidade.
A luta dos operários da construção civil é justa, é justíssima! A cidade também lhes pertence, pois em boa parte é erguida por sua luta diária! Nada mais justo do que tomarem as ruas da mesma para exigir melhores condições de trabalho, salários dignos e uma cidade para todos, e principalmente para quem mais precisa dela!
Parabéns pela mobilização e boa luta aos Trabalhadores da Construção Civil de Belém!!