quinta-feira, 7 de março de 2013

Vicente Salles


Fiquei sabendo da morte do Vicente Salles agora. É uma grande tristeza pra tod@s que passaram a conhecer mais sobre a cultura, a cultura popular, o folclore, a música e a história da região amazônica a partir de suas obras.

Vicente nasceu na vila de Caripi, município de Tomé-Açú em 1931. Em 1948 iniciou sua carreira de jornalista com os primeiros trabalhos publicados em “A Província do Pará”. No início dos anos 50 também trabalhou no jornal “O Estado do Pará”.

Em 1954, após contato inicial com grupos populares, bois, pássaros juninos e batuques, sob orientação do poeta e folclorista Bruno de Menezes, iniciou várias pesquisas no interior do estado do Pará. Seu interesse era música e cultura popular. No mesmo ano mudou para o Rio de Janeiro onde se diplomou em Ciências Sociais, com especialização em Antropologia, na Universidade do Brasil (atual UFRJ). Na década de 1960 participou da campanha em defesa do folclore brasileiro. Foi redator da “Revista Brasileira de Folclore” e também membro do Conselho de Música Popular do MIS (Museu da Imagem e do Som) do Rio de Janeiro.

Em 1972 começou a editar a série de discos “Documentário Sonoro do Folclore Brasileiro”. Em 1974 passou a morar em Brasília em decorrência de seu trabalho no Ministério da Cultura. Lecionou no Instituto Villa-lobos (no Rio) e na Faculdade de Artes do Distrito Federal, foi membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, da Academia Brasileira de Música, foi também diretor do Museu da UFPA, secretário da Câmara de Artes do Conselho Federal de Cultura e do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.

Escreveu inúmeros livros, livretos, artigos, desde o tempo em que sua produção era custeada por si mesmo até edições feitas pelo Conselho Estadual de Cultura, IAP e por editoras privadas. Entre suas obras posso destacar: A Música em Belém no século XIX (1961), Música e Músicos do Pará (1970), O Negro no Pará sob o regime de escravidão (1971), Carimbó: trabalho e lazer do caboclo (1970 - com Marena Salles), A Música e o Tempo no Grão-Pará (1980), Santarém: uma oferenda musical (1981), Sociedades de Euterpes (1985), Épocas do teatro no Grão-Pará (1994), Memorial da Cabanagem (1995), Vocabulário Crioulo (2003), O negro na formação da sociedade paraense (2004), A modinha no Grão-Pará (2005 – com transcrições musicais por Marena Isdebsky Salles) e muitos outros. Colaborou ainda na produção de aproximadamente 50 discos e CD’s.

Além da obra publicada Vicente Salles deixou mostra espantosa do talento como pesquisador. Contruiu desde os anos 1940 um imenso acervo com partituras, recortes de jornais, cartas, discos, CDs, gravações em fita magnetofônicas, imagens, etc. de todos os ramos da vida cultural e política da Amazônia. Carnaval, boi-bumbá, carimbó, batuques, negro, caboclo, religiosidade popular, quadra junina, quadra nazarena, literatura de cordel, literatura canônica, jornalismo, música popular, erudita e folclórica são alguns temas encontrados no seu acervo, atualmente sob resguardo do Museu da UFPA.

Salles além de pesquisador foi um grande divulgador da cultura e da música amazônica por onde passava. Teve uma atuação fundamental, por exemplo, para a preservação da obra do violonista e “chorão” Tó Teixeira. Graças à sua ajuda tivemos o primeiro registro fonográfico de parte de sua obra no LP “Lá vem o tio Tó”, do selo Marcus Pereira, em 1977. É interessante que Tó e Salles formaram uma parceria a partir do final da década de 1960, quando o violonista do popular bairro do Umarizal atuou como um investigador da cultura popular. Tó Teixeira coletou dados, nomes, fatos e memórias que ajudaram a produção acadêmica do amigo folclorista. Essa afinidade está documentada nas inúmeras cartas trocadas entre os dois personagens e que se encontram no Acervo Vicente Salles do Museu da UFPA. Recentemente o historiador e violonista Thomaz Silva escreveu uma interessante monografia sobre esse tema.

Para mim Vicente Salles está emparelhado com grandes nomes da pesquisa cultural e folclórica do Brasil do século XX-XXI, tais como Câmara Cascudo e José Ramos Tinhorão. É uma enciclopédia que permanecerá viva nos seus inúmeros livros e em seu acervo. A cultura brasileira e em especial a cultura amazônica fica órfã com seu desaparecimento, mas permanecerá grata por sua grande obra.

Pra quem quiser conhecer a história e a cultura do Brasil, particularmente dessa parte Norte do país, fica o convite pra conhecer Vicente Salles, que ainda nos acompanhará por muitos e muitos anos por tudo que produziu e nos deixou.

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