Fiquei sabendo da morte
do Vicente Salles agora. É uma grande tristeza pra tod@s que passaram a conhecer
mais sobre a cultura, a cultura popular, o folclore, a música e a história da
região amazônica a partir de suas obras.
Vicente nasceu na vila
de Caripi, município de Tomé-Açú em 1931. Em 1948 iniciou sua carreira de
jornalista com os primeiros trabalhos publicados em “A Província do Pará”. No
início dos anos 50 também trabalhou no jornal “O Estado do Pará”.
Em 1954, após contato
inicial com grupos populares, bois, pássaros juninos e batuques, sob orientação
do poeta e folclorista Bruno de Menezes, iniciou várias pesquisas no interior
do estado do Pará. Seu interesse era música e cultura popular. No mesmo ano
mudou para o Rio de Janeiro onde se diplomou em Ciências Sociais, com
especialização em Antropologia, na Universidade do Brasil (atual UFRJ). Na
década de 1960 participou da campanha em defesa do folclore brasileiro. Foi
redator da “Revista Brasileira de Folclore” e também membro do Conselho de
Música Popular do MIS (Museu da Imagem e do Som) do Rio de Janeiro.
Em 1972 começou a
editar a série de discos “Documentário Sonoro do Folclore Brasileiro”. Em 1974
passou a morar em Brasília em decorrência de seu trabalho no Ministério da
Cultura. Lecionou no Instituto Villa-lobos (no Rio) e na Faculdade de Artes do
Distrito Federal, foi membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, da
Academia Brasileira de Música, foi também diretor do Museu da UFPA, secretário
da Câmara de Artes do Conselho Federal de Cultura e do Serviço do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional.
Escreveu inúmeros livros,
livretos, artigos, desde o tempo em que sua produção era custeada por si mesmo
até edições feitas pelo Conselho Estadual de Cultura, IAP e por editoras privadas.
Entre suas obras posso destacar: A Música em Belém no século XIX (1961),
Música e Músicos do Pará (1970), O Negro no Pará sob o regime de
escravidão (1971), Carimbó: trabalho e lazer do caboclo (1970 - com
Marena Salles), A Música e o Tempo no
Grão-Pará (1980), Santarém: uma oferenda musical (1981), Sociedades de Euterpes (1985), Épocas do teatro no Grão-Pará (1994), Memorial
da Cabanagem (1995), Vocabulário Crioulo (2003), O negro na formação da sociedade paraense (2004), A modinha no
Grão-Pará (2005 – com transcrições musicais por Marena Isdebsky Salles) e
muitos outros. Colaborou ainda na produção de aproximadamente 50 discos e CD’s.
Além da obra publicada
Vicente Salles deixou mostra espantosa do talento como pesquisador. Contruiu
desde os anos 1940 um imenso acervo com partituras, recortes de jornais,
cartas, discos, CDs, gravações em fita magnetofônicas, imagens, etc. de todos
os ramos da vida cultural e política da Amazônia. Carnaval, boi-bumbá, carimbó,
batuques, negro, caboclo, religiosidade popular, quadra junina, quadra
nazarena, literatura de cordel, literatura canônica, jornalismo, música
popular, erudita e folclórica são alguns temas encontrados no seu acervo,
atualmente sob resguardo do Museu da UFPA.
Salles além de pesquisador
foi um grande divulgador da cultura e da música amazônica por onde passava.
Teve uma atuação fundamental, por exemplo, para a preservação da obra do
violonista e “chorão” Tó Teixeira. Graças à sua ajuda tivemos o primeiro registro
fonográfico de parte de sua obra no LP “Lá vem o tio Tó”, do selo Marcus
Pereira, em 1977. É interessante que Tó e Salles formaram uma parceria a partir
do final da década de 1960, quando o violonista do popular bairro do Umarizal
atuou como um investigador da cultura popular. Tó Teixeira coletou dados,
nomes, fatos e memórias que ajudaram a produção acadêmica do amigo folclorista.
Essa afinidade está documentada nas inúmeras cartas trocadas entre os dois
personagens e que se encontram no Acervo Vicente Salles do Museu da UFPA. Recentemente
o historiador e violonista Thomaz Silva escreveu uma interessante monografia sobre
esse tema.
Para mim Vicente Salles
está emparelhado com grandes nomes da pesquisa cultural e folclórica do Brasil
do século XX-XXI, tais como Câmara Cascudo e José Ramos Tinhorão. É uma
enciclopédia que permanecerá viva nos seus inúmeros livros e em seu acervo. A
cultura brasileira e em especial a cultura amazônica fica órfã com seu
desaparecimento, mas permanecerá grata por sua grande obra.
Pra quem quiser
conhecer a história e a cultura do Brasil, particularmente dessa parte Norte do
país, fica o convite pra conhecer Vicente Salles, que ainda nos acompanhará por
muitos e muitos anos por tudo que produziu e nos deixou.
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