sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Salve Mestre Verequete!!

Augusto Gomes Rodrigues, o Verequete, nasceu em Quatipurú em 16 de agosto de 1916 . Era filho de Antônio José Rodrigues e D. Maximiana, sendo o penúltimo de seis irmãos. Seu pai era conhecido como Antônio Maranhense, em decorrência de ter nascido naquele estado, e era um popular freqüentador de manifestações da cultura popular. O nome Verequete, pelo que ele mesmo narra, teria surgido em Belém, quando Augusto Gomes Rodrigues foi a um terreiro de umbanda em companhia de uma namorada. Impressionado com os cânticos e batucadas do ritual e principalmente com o cântico referente à entidade Verequete, ele teria voltado para casa cantando insistentemente aquela música e teria recebido o apelido dos amigos a partir daí.
Desde muito pequeno Verequete trabalhou em várias atividades, o que o impediu de aprender a ler e escrever . Desde os oito anos de idade já se envolvia em cordões de pássaro e bois-bumbás, em boa parte por influência de seu pai. Aquele tipo de atividade fazia parte de seu cotidiano desde muito pequeno. Segundo o que afirmou, teria fundado o seu próprio boi-bumbá ainda com oito anos de idade .
Por volta dos 12 anos deixou sua casa e foi morar com um irmão na vila de Careca, no município de Bragança. Mais tarde foi morar com um tio de melhores condições de vida, por algum tempo. Na juventude percorreu várias cidades do interior do estado, trabalhando em várias atividades. Morou na cidade de Capanema por dez anos, trabalhando como foguista na usina de luz. Depois foi ainda para Ananindeua, onde trabalhou como cortador de lenha para o trem que ia até Bragança. Finalmente foi morar em Icoaraci, distrito de Belém, onde permaneceu por cerca de 40 anos .
Participava ativamente das festas populares de rua e chegou a fundar seu próprio grupo, chamado “Pai da malhada”. Em relação à atividade de criador de folguedos populares, ele se considerava um “folclorista”, que no seu entender é aquela pessoa que cria o folclore: “A arte do folclorista é compor a música que entra no juízo dele e ele rima aquela música e bota tudo igual” .
Durante sua morada em Icoaraci participou de competições de bois-bumbás que a Prefeitura de Belém promovia. Dentre os bois que fundou ou participou, estão o “Flor da noite”, o “Pai da Malhada”, que era seu, e “Ramo dourado”. Por volta dos anos 60 diz que deixou o boi-bumbá e passou a se dedicar ao carimbó .
No Final daquela década teria feito uma festa em sua casa em Icoaraci e convidou o único grupo de carimbó que existia nas redondezas: “aí surgiu um [grupo de carimbó] no quilometro 23, mas não prestava para a família ver, era só pra bebedeira”. Como não existiam outros grupos que pudessem ser “pra família ver”, Verequete diz que resolveu fundar o seu próprio grupo, e em 1971 criou o “Uirapuru do Amazonas”. Nesta época suas apresentações se davam principalmente em Icoaraci. O carimbó ainda não havia se tornado popular em Belém: “Não tinha dentro de Belém, não se ouvia falar nem em carimbó” .
Verequete foi um dos primeiros artistas de carimbó a gravar um LP, em 1971, antes mesmo que Pinduca. O LP foi gravado em Belém nos estúdios da Radio Marajoara, segundo Vicente Salles , em só um dia, pela “Equipe Utilidades Domesticas”. Sobre seu pioneirismo, disse uma vez: “Não inventei nada, apenas fui o primeiro a botar o ritmo no salão” . Após este LP, com o sucesso crescente do carimbó em Belém e depois em outros estados, Verequete lançou vários outros discos. Contudo, diferente de Pinduca, por exemplo, a sua trajetória foi bastante tortuosa. Dos LPs lançados nos anos 70 não se aproveitou quase nada. Costuma dizer que foi enganado inúmeras vezes por seus empresários e acabou quase na miséria.
Em 1980 mudou-se para o bairro do Jurunas, na periferia de Belém. Neste momento o carimbó estava vivendo uma fase de refluxo após o período de grande sucesso na primeira metade dos anos 70. Sem receber nada ou quase nada de direitos autorais dos seus discos, acabou passando por dificuldades financeiras e se afastou da música por um longo período. Nos anos de 1990 Verequete vendia “churrasquinhos” na frente de sua casa para poder se sustentar. Seu caso foi característico de muitos outro de grupos de carimbó que surgiram nos anos 70 e depois desapareceram. Seja por inexperiência no trato com o mercado, seja por terem tido maus empresários, acabaram não desfrutando dos lucros do auge do carimbó.
O tipo de carimbó que Verequete tocava era o chamado “pau-e-corda” ou “carimbó de raiz”, isto é, o carimbó feito de maneira tradicional. Este tipo de carimbó seguia no geral o seguinte modelo: 1. tinha por base rítmica dois grandes tambores feios de troncos de madeira oca, o curimbó, medindo cada um em torno de 1 metro a 1,5 de comprimento por cerca de 50 centímetros de diâmetro. Geralmente um curimbó é maior que o outro, servindo, respectivamente, o grande para marcação do ritmo e o menor para repique, um mais grave e outro mais agudo. O tambor é fechado de um lado das extremidades por couro de animal entesado; o outro lado aberto serve para evacuação do som potente dos tambores. 2. Fora os tambores outros instrumentos podem fazer parte do “carimbó de raiz”, geralmente um banjo, um pandeiro, um ganzá, dois pauzinhos - que servem para batucar na parte de trás do curimbó, na madeira do tambor, criando um efeito sonoro equivalente a batida das mãos no couro - e um instrumento de sopro, clarinete ou flauta. Diferentemente de Pinduca, Verequete não quis “modernizar” o seu carimbó, manteve-se fiel ao que considerava autenticidade do ritmo: “Eu já cheguei a comprar um conjunto eletrônico, mas não me acostumei. É a minha opção. Quando eu nasci era assim, não havia eletricidade. É interessante mostrar como era feito no passado” .
Como nunca aprendeu a ler nem a escrever, suas músicas eram criadas e mostradas a pessoas que pudessem escrevê-las, geralmente a sua mulher, e mais recentemente eram gravadas em um gravador portátil para depois serem mostradas à sua banda .
Verequete, como outros músicos populares, não se dedicou somente ao carimbó, fez também outros tipos de música como xote e retumbão, em particular o retumbão bragantino .
Em 1997 lançou o CD “Uirapuru da Amazônia”, realizado pela SECULT, Secretaria de Cultura do Estado do Pará. Declarou em depoimento que graças a esse CD conseguiu comprar uma casa própria no bairro do Jurunas, nos anos 90. Esse fato mostra muito bem como em seu caso o carimbó não rendeu lucros suficientes para uma condição de vida estável.
Mas tarde Verequete recebeu prêmios nacionais do Ministério da Cultura e teve apoio da Prefeitura de Belém na administração do PT à época (com Edmilson Rodrigues). Sua situação voltou a piorar quando houve mudanças na administração municipal.
Verequete morreu em 3 novembro de 2009. Apesar das grandes dificuldades que passou em vida foi e é um dos maiores representantes da cultura popular amazônica e brasileira. Negro, pobre, analfabeto, suburbano, amazônida, brasileiro que mostrou que a riqueza da cultura e a beleza da arte podem enfrentar todo tipo de adversidade.
No dia de seu velório, no Teatro da Paz, tomei umas cervejas com uns amigos no Bar do Parque, para beber o morto com alegria! Alegria se deve ao fato de que a cultura popular não morre, apenas se transforma, já que ele é a alma pulsante da população excluída da sociedade, é uma maneira de mostrar que estamos aqui, mesmo que os poderosos não queiram nos ver. A alegria se deve à vitalidade da cultura popular, e dentro disso do carimbó, pois como já dizia o mestre: “O carimbó não morreu! Está de volta outra vez! O Carimbó nunca morre, quem canta o carimbó sou eu!!”

E viva Mestre Verequete! Viva o Carimbó!

2 comentários:

  1. Morei na Rua dos Caripunas de 1982 à 1985, dos meus 11 aos 14 anos de idade. Nessa época sempre comprava churrasco de um senhor que tinha uma banquinha nas esquina da Caripunas com a "Estrada Nova", ele me chamava a atenção por usar um chapéu que parecia com os de vaqueiros e, também, por frequentemente estar de roupa branca. Alguns anos antes o carimbó era bastante divulgado em Belém e eu conhecia alguns. Mas foi num dia, quando fui comprar refrigerante em uma taberna, que ouvi uma conversa que mudaria para sempre a minha visão a respeito daquele vendedor de churrasco. Um homem que bebia cerveja na taberna, exibia um LP de carimbó que fora gravado no final da década de 70, e nele tinha a foto do tal vendedor. O homem falava o seguinte: "De cantor à vendedor de churrasco". Eu fiquei curioso e perguntei: "É aquele senhor que vende churrasco lá na esquina?". A resposta foi um aceno positivo com a cabeça. Anos mais tarde, em novembro de 1998, quando trabalhava como cinegrafista em uma atividade da Rádio Margarida em que o Mestre Verequete participou, ganhei um CD autografado em letras de forma: "VEREQUETE". O CD desapareceu, mas ficou na lembrança a imagem daquele senhor que cantava algo que sempre esteve em mim e que que sempre me emocionou e emociona.
    Tony, no texto tu falas que o verequete vendia churrasquinho nos anos de 1990, porém eu já comprava churrascos dele desde 1983, mas acho que isso não tem muita importância. O importante é que o cantar de Verequete está presente em todos nós que apreciamos e pretendemos levar em frente esse canto. Abraços!

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  2. Gosto muito desse ritmos pena que não e muito divulgado

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