terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Sobre a divisão do Pará.

Recentemente um amigo do Rio perguntou a minha opinião sobre a divisão do estado do Pará. Estava querendo escrever sobre isso faz algum tempo e com a pergunta dele acabei me forçando a fazê-lo agora. Sendo assim, coloco minha opinião sobre isso, de maneira objetiva e sem falsos "paraensismos":


Então vamos por parte.
1. Grosso modo quem propôs a divisão foram setores da elite paraense ligados às regiões em questão. Na verdade os projetos de divisão foram elaborados por políticos de fora do Pará. Aqui quem sustenta a divisão é a elite ligada ao agro-negócio, madeireiras, fazendeiros, etc. e que obviamente pretendem mais espaço político com a criação de novos estados. Os interesses são econômicos e políticos de fato e não sociais.
2. Culturalmente falando há uma divisão real entre as regiões (não necessariamente na ordem que foi traçado o mapa da divisão). Essa divisão cultural é fruto dos processos migratórios recentes, das últimas décadas. Ou seja, já existe uma divisão de linguagem, de costumes, de modos de vida, etc. Para a população pobre dessas regiões a divisão aparece como possibilidade de melhoria de vida, já que o modelo de desenvolvimento econômico do Pará, pelo menos desde a Ditadura militar, foi o de favorecer os ricos e excluir a população das terras, dos recursos que geram distribuição de riqueza, etc. Ou seja, são populações que necessitam realmente de melhorias muito significativas nas suas regiões, mas infelizmente os interesses dos setores que coordenam a divisão, das elites, não é exatamente atender a essas necessidades. Com a divisão não há perspectiva nenhuma para mudança do modelo econômico, ou seja, o controle das terras e recursos naturais permanecerá nas mãos das mesmas elites locais e grandes empresas internacionais, etc. Os grupos que coordenam a divisão nem de longe tratam deste assunto, porque não lhes interessa mudar essa realidade!
3. Algumas pesquisas já mostraram que a criação dos estados, por outro lado, não resolverá os problemas sociais da região em decorrência de que eles surgirão como estados deficitários. Demorará décadas talvez para que esses estados possam se equilibrar do ponto de vista de suas receitas. Isso significa que provavelmente permanecerão como estados pobres e com desigualdades sociais marcantes. Não apenas pelo desinteresse das elites “separatistas”, nem só pelo modelo concentrador de riqueza que não foi em nenhum momento questionado por essas, mas também porque os estados serão deficitários desde o início e possivelmente continuarão assim por longos anos.
4. Do ponto de vista ecológico a divisão poderá levar a um avanço da fronteira agrícola rumo ao estado do Tapajós, que é a região que tem proporcionalmente maior quantidade de florestas. Ora, mesmo com as reservas legais é muito certo que a separação deste abriria uma nova possibilidade da expansão madeireira, agrícola, etc. para aquela região.
5. A elite do Pará, não separatista, particularmente o PSDB e grupos ligados a ele, aproveita o debate do plebiscito pra propagandear um falso estado que ruma ao progresso. Nas propagandas do Gov. do Estado todos os problemas reclamados pelas regiões que pretendem se separar não existem. Pura hipocrisia. Ninguém pode negar que existem problemas reais que atingem diretamente a população mais pobre destas regiões, essa é a base de suas reclamações!
6. Grande parte da esquerda, parte do PT e o PSOL todo, parece-me que são contra a separação, pelos motivos que descrevi acima. Mas nas regiões em disputa mesmo parte dos setores “progressistas”, talvez a parte menor, creio eu, seja favorável a separação. Na verdade os debates sobre o plebiscito chegam a ser risíveis. De um lado os separatistas prometem mundos e fundos para as populações locais sem questionar em nenhum momento as regras do jogo econômico e políticos do estado, ou seja, não questionam o modelo concentrador e excludente da região, a devastação de florestas por conta desse modelo e a expansão da fronteira agrícola e mineral. De outro, os que defendem a unidade do Pará (refiro-me aqui exclusivamente ao governo e aos setores conservadores, que são quem de fato estão comandando a campanha da não separação) fingem que tudo está numa boa e aproveitam os espaços midiáticos apenas para apelar a um “paraensismo” “patriótico”, cafona e alienado! Resume-se todo o debate a se o “tacacá” ou a estrela da bandeira do Brasil, que corresponde ao estado do Pará, vão ser ou não divididos!
7. Ou seja, muito pouco das questões que poderiam ser discutidas nestes debates não o estão sendo: a reversão do modelo econômico, a maior descentralização da ação do estado, a renegociação com as grandes empresas como a Vale do Rio Doce, uma revisão radical do modelo de ocupação de terras, a resolução dos conflitos agrários, a punição e impedimento das grilagens, a questão dos assassinatos no campo, uma nova repactuação com o poder central no debate sobre a lei Kandir e mesmo um amplo debate sobre o papel da Amazônia no conjunto da nação. Esses são os assuntos que praticamente não são tratados neste amplo debate!
8. Ou seja, estamos em maus lençóis e aparentemente continuaremos assim por um bom tempo. Eu sou contra a divisão por entender que ela não resolverá as verdadeiras questões que precisam ser discutidas. Vou votar não e não! Mas espero que este debates falso que está ocorrendo, sirva pelo menos pra que mais adiante possamos discutir os verdadeiros temas sobre o Pará e sobre a região amazônica!

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