Para além do SIM e do NÃO.
Por Fábio Pessôa (historiador e militante do PT)
A campanha sobre o plebiscito ficou mesmo no maniqueísmo do SIM ou NÃO. O problema de fundo, a socialização da riqueza produzida, passou longe do debate. Infelizmente, a velha e nova direita deu a linha política tanto para o SIM quanto para o Não. A impressão que dá é que, seja qual for o resultado do Plebiscito, a divisão existente no estado irá se acentuar ainda mais.
Quando falo de divisão, não estou me referindo ao separatismo político administrativo. Não falo de uma fronteira territorial, mas de uma fronteira identitária, marcada não só pelas diferenças/clivagens étnicas, culturais como também de classes. Quando as peças publicitárias falavam de um Pará pobre e outro rico, estavam se referindo às riquezas naturais e não ao acúmulo de riquezas existentes entre pessoas ricas e pobres. O termo paraensismo se refere a um sentimento de identidade único e homogêneo, como se todos os paraenses fossem iguais, independente de sua condição sócio-econômica. Só que esse sentimento só existe na propaganda.
O debate sobre o modelo de desenvolvimento regional, por exemplo, ficou marginalizado ou suprimido no debate. O que fazer com o avanço da soja? Como equilibrar a produção alimentar com a preservação do meio ambiente? O que fazer com a riqueza produzida pela exploração mineral? Como lidar com as mortes no campo e as chacinas nas grandes cidades? E a reforma agrária, ainda vai ser tratada como uma “questão federal”? Tantas perguntas poucas respostas.
O sentimento do “nós” contra “eles” tem radicalizado o divisionismo pré-existente, podendo deixar cicatrizes profundas entre a população. É legítimo o desejo autonomista das regiões de “Carajás” e “Tapajós”. Como é legítimo o desejo dos contrários à separação. O debate de fundo, no entanto, não é esse. A fronteira pensada enquanto acesso direto dos produtores aos bens naturais está de fora desse debate, valendo a lógica do “dividir para concentrar”. Por outro lado, não está sendo proposto um modelo de gestão dos recursos públicos de modo a equilibrar os investimentos com vistas a equilibrar as diferenças.
Do jeito que está à pobreza do debate em torno do SIM e do Não irá se somar a indiferença de uns com a truculência de outros, sem falar do oportunismo de outros tantos. A única coisa boa disso tudo é a experiência democrática consubstanciada pela prática do Plebiscito, prática incomum no Brasil. Que essa seja a forma para decidir sobre temas de relevância nacional, como o Plebiscito pela reestatização das empresas privatizadas, como a poderosa Vale, a descriminalização do aborto e das drogas, entre outras matérias polêmicas e restritas a decisão de um Congresso visto com cada vez mais desconfiança pela população. Pelo menos algo de bom podemos esperar desse processo marcado pelo rebaixamento do debate político.
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