E a cidade continua acordada nesta manhã ensolarada.
Os automóveis tomam suas artérias.
Os engarrafamentos são como pulsões nervosas que mostram que
todos estão vivos.
“O pulso ainda pulsa”.
O vendo ainda sopra em algum lugar.
Na rua, em meio a coisas animadas e inanimadas, mendigos
dormem tranqüilos, se espreguiçando da noite recém acabada.
Na padaria o pão deve estar quentinho.
No ponto de ônibus as pessoas se amontoam.
Naquela arvore da avenida, na praça, os pássaros já fizeram
algumas revoadas coordenadas e pirotécnicas. Pareciam fogos de artifício no
nascer do dia.
Muitas coisas aconteciam naquela manha na cidade e no mundo:
Maria largou o mestrado. Encheu o saco de ter que bajular professor
doutor, catedráticos que só pensam no seu umbigo!
Roberto continuou fazendo exatamente o que sempre fez a
vida toda. Trambalhar e trabalhar e trabalhar e trabalhar na padaria da
esquina, onde fazia pão. Acordava todos os dias às 4 da manhã e o salário no
final do mês quase não dava pra comprar o gás de cozinha.
Marlene continuou velha até que morreu um dia, enquanto
dormia. Amanheceu morta enquanto os pássaros faziam revoada.
Antônio largou o emprego e abriu um bar no Marajó. Casou com
uma italiana que fazia turismo. Depois de alguns meses foram embora pra Itália,
de onde me mandam cartões postais muito bonitos, de vez em quando. Soube
recentemente que o seu primeiro filho nasceu!
Aquele garoto de que não lembro o nome reapareceu no bairro
da periferia. Estava de bicicleta na esquina quando eu chegava em casa um dia
desses. Magro, sorriu pra mim e me disse “fala vei, qual é a sua já?!”. Pediu
um trocado como de costume. Neguei inicialmente, mas como não o via há meses resolvi
lhe dar um real.
Às vezes sinto que um dia ele vai desaparecer e não vai ressurgir
mais...
Meio querendo me assustar, manter a fama de mau que perdera
na comunidade, ainda me disse, quando o perguntei por onde tinha andado: “Pô,
eu tava puxando cadeia de novo tio! Mas tá tudo de boa agora!”. Eu falei: “te
cuida meu!”. E fui embora pra casa.
E a manhã seguia, até que o dia foi passado, e quando
percebemos, todos nós, cada um no seu canto, já era noite!
Ah, o cotidiano! Enlouquecedor e massante ao mesmo tempo!
ResponderExcluirCadê ocê homi? Ocupado?!
ResponderExcluirUm pouquinho enrolado mesmo, mas ainda esses dias tô colocando coisas novas aqui. Obrigado por perguntar. Beijos!
ResponderExcluir"Roberto continuou fazendo exatamente o que sempre fez a vida toda. Trambalhar e trabalhar e trabalhar e trabalhar na padaria da esquina, onde fazia pão. Acordava todos os dias às 4 da manhã e o salário no final do mês quase não dava pra comprar o gás de cozinha."
ResponderExcluirPQP, parece comigo, hahaha.
Gostei.
Nicoly Uchôa.
Isso me lembra alguém! Ih! Eu mesmaaaaa! Humpft!
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